segunda-feira, 30 de novembro de 2009

01/11/09

Vieste depois do carnaval
que era pra não passar, mesmo
E o amor não foi fato
até hoje
é só fantasia
que eu visto, insistente
em ocasiões que não deveria

Eu já me sinto ridícula
com tanta pluma na cabeça
Dor de quarta-feira de cinzas
sempre que há silêncio

Foi aventura insana demais
toda essa poesia.
Mas eu não me culpo.
A dança era muita
o ritmo, frenético
e eu estava absolutamente bêbada
de desejo.


Mulheres imorais

São um fato. Existem.

Mulheres... Eu queria saber até que ponto nós temos opção sobre o sentimento que sentimos. E até que ponto o sentimento que atuamos se faz com base no que realmente queremos.

O que queremos? Esse tesão que corre pelas veias desestruturando o meio das pernas, essa necessidade de ser amada e cuidada por inteiro... E de se entregar, e de ferver, e de doer se for preciso, contanto que intensamente feminino...

O amor é uma conquista? Ou ele é o motor que nos leva a conquistar? Conquistar o quê, exatamente? Que parte de nós mesmas ganha com essa batalha toda? Luta indigna de reconhecimento...

A imoralidade, segundo a lógica, parece ser a conseqüência de uma escolha. Conseqüencia que vem no pacote de quem escolhe. Eu queria poder escolher minhas paixões. Mais precisamente desescolhê-lhas, quando elas já nem disfarçam e se tornam apenas a ponta de faca pra dar os murros. Quanto mas madura e independente os dias me tornam, mais certa eu estou de que não tenho opção sobre uma série de coisas. Burocracias do mundo, alguns tapas na cara, algumas necessidades do meu peito.

Nossos seres femininos de fato optam por arder, ou foi a Paixão que nos escolheu pra ser sede de seus ardores?

Em meio à infinita bagunça das coisas minhas no cantinho meu

05/09/09

“Peixe boi, feixe luz
Quem foi que fui”

(Chico César, Feixe)

Em meio à infinita bagunça das coisas minhas no cantinho meu, o reflexo que se olha no espelho é assustadoramente meu.

A imagem canta, de voz frágil. Levemente machucada pela força dos vai-e-vens da vida – o vento, as temperaturas, os extremos do seco e da água congestionaram os pulmões. Mas o que congestiona mesmo é a fragilidade das segurança s e certezas que o mundo propõe pra gente. O registro, o salário, o contrato. Tudo o que se considera centro de vida cá no mundo se propõe tão rígido, tão sólido... E de um minuto pro outro some, como se fosse água pra evaporar.

Não, nada do que há no mundo é nosso, de fato. As certezas que eu dou (pra tantos), em verdade não me convencem. Elas não se convencem, por si mesmas, não se bastam.

Os olhos que fugiram do próprio reflexo no espelho estão afundados em olheiras enormes. Marrons. De pouco dormir, de muito fazer. A bagunça do quarto também é reflexo disso. E a emoção que até ontem se encontrava tão organizada, tão apoiada no trabalho que me consumia e me fazia entregar muito mais aos outros do que a mim, permanece cantando. Mas frágil...

Nada do mundo é meu, não... Mas a minha voz é quase. Quase que definitivamente minha, de tão “eu”.

O reflexo que vi no espelho me assustou porque era de uma menina. Um corpo que permanece delineando cada vez mais curvas, e que eu me orgulho tanto por ter fortalecido, crescido absurdamente, e está-lo lançando (em pleno movimento) à vida... Esse corpo, cuja voz cantava só, entre quatro paredes... Me trouxe a sensação (horripilante, mas que eu não rejeito) de que, no fundo, eu não deixo de ser a mesma menina de sempre. E não pela timidez, que sumiu, junto com a imaturidade. Mas há um lugar de mim que, na essência, ainda quer as mesmas coisas. Embora os sonhos em si, como conceitos, já sejam entendidos de forma diferente, de tanto que estão sendo praticados...

Fugi da voz e vim pras letras pra organizar a emoção que se assustou com o tanto de mim que cá está, novamente, na sua eterna sina entre quatro paredes.

domingo, 23 de agosto de 2009

Sim, hoje eu tenho medo do silêncio. Do que ele possa significar, do quanto de mim que ele possa conter. Das impresenças latentes numa pausa, compasso do tempo avesso.

Hoje eu preencho o meu tempo com música. Qualquer silêncio precisa de som. Pra que eu não tenha que ouvir meu coração desritmado batendo forte... Porque eu não quero conversar com a minha própria emoção.

Marchas alegres ressoam nos cantos, eu canto bem forte pra ninguém. Pra ninguém querer entrar dentro de mim e preencher o vazio por ti deixado.


“Ninguém sabe a dor que eu sinto

Dentro de mim

Ninguém sabe porque eu vivo

Tão triste assim

Se eu fosse realmente

Muito feliz

Não chorava quando canto,

Não cantava para abafar meu pranto

(Capiba, Serenata suburbana)

sábado, 18 de abril de 2009

Sem tato


Me embalo num amor só meu
De fazer-se meu


O sentimento
meu calor
E a sensação
minha
de afeto ou de dor
não tem pra onde

Sensação de não caber-me no mundo
e ter que inventar todo esse mundo
secreto
inexistente
pra existir como mim
como eu
como só eu
quero

domingo, 22 de março de 2009

Aurora
(a chegada da barra do dia)

De repente eu olho pro lado e me assusto. Me assusta o azul da manhã, apenas. Porque lá não estava. Traz medo pra mim a barra do dia. Porque mais uma noite não dormida, e tanto de você em mim, ainda. E sempre. E forte. É tanto amor contido que rasga o peito por dentro. Dói, sangra... Mas não é dor causada por ti. Não, não é tu quem faz, nem tampouco o amor que escolhestes. O amor que te escolheu antes de mim. Quem dói é a noite. Em mim. De quem a culpa é ninguém.

Eu tento defesa, meus instintos fazem que vão se transformar em violência pra que eu simplesmente sobreviva... E eu não me permito. Sou guerreira que não dá nenhum golpe. Porque a única inimiga é a barra do dia, que nunca desiste de berrar (pra humanidade!) a sentença da noite que não pode ser maior.

“Porque está amanhecendo?
Peço o contrário, ver o sol se pôr
Por que está amanhecendo?
Se não vou beijar seus lábios quando você se for?”
(Nando Reis, Relicário)


Travo dentro de mim uma terrível batalha da noite contra o dia... A turbulenta noite contra o azul, macio e silencioso começo de dia. Uma luta contra o ciclo, que simplesmente vai. Nascendo... Doendo. Sempre, inevitavelmente tão vazio de ti e insuportavelmente lotado de mim.


“Pois se jura, se escojura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor na orgia
Da luz do dia

É só o que eu pedia
Um dia pra aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia

(Chico Buarque, Basta um dia)

Vaga-lumes nada vagam em mim. São precisos. Preciosos. Só de vê-los eu vou direto ao centro do peito, direto ao amor primeiro. O amor maior, da noite maior que ainda está por vir.

Vaga-lumes e estrelas. Noite plena. E solitária. A beleza do escuro me leva ao palco. Olhar no palco, corpo atento na platéia. Mente no fundo dos seres... A pouca luz no centro memória. De noites belas que não foram minhas, mas belas pude sabê-las. Da dança alheia que me envolve tanto. Tão sutil e generosa. Precisa. Traz ternura inteira em mim.

Saudade muito forte. De quem eu amo, do que nem sei. Saudade de uma história que eu ainda não vivi. Vontade dos contos belos que eu ainda não escrevi. Memória intensa das cenas que me tocaram tão amplamente... Da peça que tem permeado tanto os meus textos ultimamente. Peça de um quebra-cabeças previamente existente... Esse palco (de sempre) dessa vez (ainda mais do que sempre) me levou pra um lugar de mim que me faz inteira. Me completa. Donzela nos gestos, guerreira latente. Amante em pausa, em espera. Só imagens, e sons, e versos. Só eu. Só. Repleta. De noite...

Noite grande, mas não maior do que o que cabe em mim. Noite rara. Porque essa, em verdade, eu nem anseio fazer maior. Paz. Basta. Bastam esses segundos, essas imagens. Essas presenças no peito, essa solidão no fato – embaixo da lua, diante do vento. E cá, com meu centro, meus mestres na estrada. De pés tão distantes, no céu tão presentes... De luzes viventes, no peito, saudades.

Noite serena, noite de pausa. Noite pra se dormir, diferente de tantas outras. Não que não exista o álcool... E os anseios (pré-existentes). Mas o mar e o sol, no dia, foram mais fortes que a poesia da noite. No dia, areia suficiente pra não deixar nada esfarelar de noite. E a poesia da noite não foi sem fato.

Hoje eu me basto em mim...
_ _ _

[Esse texto eu escrevi em janeiro desse ano, no litoral, numa madrugada quente e deliciosa, em que me foi permitido acessar o céu
sem telhados nem nuvens, e com estrelas. E as negras árvores da montanha ao
fundo tinham luzinhas verdinhas piscantes...
"A noite estava maior". Portanto,
a ela eu me entregava. Não queria detê-la, como a tantas outras. Mas quis
apreender sua poesia (como sempre, como tantas outras). Principalmente porque
aquele escuro iluminado me remeteu ao "Donzela Guerreira", a peça de
dança-teatro dos meus queridíssimos mestres Juliana Pardo e Alício Amaral.
O
texto é uma reflexão pra mim. A publicação acaba virando uma homenagem a eles.
Assim espero...]